sábado, 29 de maio de 2010

Álcool e jovens

O consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes é um problema que desperta preocupação no mundo todo. A discussão é de grande importância para a saúde pública, sendo necessária a atenção das autoridades, profissionais da saúde, pais e educadores

Por Arthur Guerra de Andrade / Natália Gomes Ragghianti / Lúcio Garcia de Oliveira

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O consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes (12 a 17 anos) e adultos jovens (18 a 24 anos) é um sério problema que desperta grande preocupação no mundo todo. Ao contrário do que muitos acreditavam no passado, na fase de transição entre a infância e a vida adulta, o sistema nervoso central dos jovens ainda se encontra em desenvolvimento. Desta maneira, suas vias neuronais podem se tornar mais suscetíveis aos danos causados pelo álcool, levando ao comprometimento de várias funções.
Em um período repleto de mudanças físicas, psicológicas e sociais, sob os efeitos do álcool, os jovens ficam mais propensos a comportamentos de risco. Nota-se, ainda, que uma série de fatores individuais, sociais e econômicos, principalmente a família e colegas, influencia o uso de álcool pelo jovem. No Brasil, segundo dados do II Levantamento Domiciliar Sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil, 2005, cerca de 54% e 79% dos jovens de 12-17 anos e de 18-24 anos, respectivamente, já haviam experimentado alguma bebida alcoólica em sua vida (uso de álcool na vida). Nestas mesmas faixas etárias, a dependência de álcool foi de 7,0% e de 19,2%, respectivamente. Essas altas prevalências ilustram a relevância do tema em nosso país.

Pesquisa revela

Mais recentemente, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realizou uma pesquisa nacional entre estudantes da 9ª série do Ensino Fundamental (Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2009, PeNSE), com média de idade entre 13 e 15 anos, e os resultados foram alarmantes. A taxa de uso de álcool na vida foi de 71,4%, sendo que 22% dos escolares responderam que já beberam até se embriagar.
Nos últimos 20 anos, observou-se que a exteriorização de emoções (comportamentos agressivos, impulsivos, ou descontrolados) e, em menor grau, a interiorização das mesmas (comportamentos ansiosos ou depressivos), duas características detectáveis na infância, são potenciais marcadores de uma predisposição para o uso precoce de álcool, que está associado ao histórico de consumo abusivo e de dependência de álcool. Por exemplo, foi estimado que indivíduos que iniciam o consumo de álcool antes dos 16 anos de idade possuem risco 1,3 a 1,6 vezes maior de desenvolver dependência alcoólica, e que cada ano de atraso no início da ingestão de álcool seria capaz de gerar uma redução de 14% no risco para a dependência alcoólica. Assim, a idade de início do uso de álcool é um dos principais pontos de referência para avaliar os possíveis riscos de problemas associados. Em paralelo, vários pesquisadores sugerem que tal efeito seria decorrente do fato de que a idade de início modera a influência de outros fatores (hereditários e ambientais) sobre o uso dessa substância.
Em crianças submetidas a situações de estresse elevado, o início da ingestão de álcool é mais precoce e o risco de consumo frequente pode ser maior. Tal dinâmica pode ser observada entre as crianças em situações de rua no Brasil: constatou-se que 33% dos jovens de 9 a 11 anos de idade e 77% dos jovens de 15 a 18 anos de idade consumiam álcool.

"Estima-se que indivíduos que iniciam o consumo de álcool antes dos 16 anos de idade possuem risco 1,3 a 1,6 vezes maior de desenvolver dependência alcoólica"


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Em crianças submetidas a estresse elevado, o início da ingestão de álcool é mais precoce e o risco de consumo frequente pode ser maior. Tal dinâmica pode ser observada entre as crianças em situações de rua no Brasil
Arthur Guerra de Andrade é médico Psiquiatra, Professor Associado do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Professor Titular de Psiquiatria e Psicologia Médica, Faculdade de Medicina do ABC, Presidente Executivo do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

Natália Gomes Ragghianti é bacharel em Psicologia e Pesquisadora Assistente do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

Lúcio Garcia de Oliveira é biomédico, Mestre e Doutor em Psicobiologia pelo Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Atualmente é pós-doutorando pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP

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